sábado, 21 de agosto de 2010

SAKINED 'FOI FORTEMENTE ESPANCADA E TORTURADA ATÉ ACEITAR APARECER EM FRENTE ÀS CÂMERAS

Em entrevista à TV estatal, mulher condenada ao apedrejamento admite culpa por adultério e assassinato e critica o próprio advogado

Helio P. Leite

13.08.2010


Sakineh Mohammadi-Ashtiani, 43 anos, vestia o chador preto e segurava um papel. Falava no idioma azeri turco e sua voz era praticamente ofuscada pela tradução simultânea para o persa. Na entrevista ao 20:30, programa da TV estatal de seu país, ela admitiu ter cometido adultério com o primo do marido e alegou saber que o amante mataria o cônjuge para que ficassem juntos. “Eu estabeleci contatos telefônicos com um homem em 2005”, disse. “Ele me enganou com sua linguagem… Ele me disse ‘vamos matar seu marido’. Eu não poderia acreditar que meu marido seria morto e pensei tratar-se de uma brincadeira. Depois, descobri que assassinar era a profissão dele”, acrescentou. A entrevistada — que tinha o rosto desfigurado com um borrão feito pela emissora — contou que o homem chegou à sua casa carregando equipamentos. “Trouxe dispositivos elétricos, fios e luvas. Então, matou meu marido, eletrocutado. Antes, pediu-me que mandasse meus filhos para a casa da avó”, revelou. Ela também não economizou críticas ao próprio advogado, Mohammad Mostafaei (leia entrevista abaixo). “Por que ele levou o caso à televisão? Por que ele me desgraçou? Por que me desacreditou, perante meus familiares, que não sabiam que eu estava na prisão? Agora, eu tenho queixas contra ele”, desabafou. A suposta Sakineh acusou Mostafaei de jamais ter se reunido com ela.

Houtan Kian, também advogado da iraniana, garantiu ao jornal britânico The Guardian que sua cliente foi submetida a tortura. “Ela foi fortemente espancada e torturada até aceitar aparecer em frente às câmeras”, disse. A sessão de violência teria durado dois dias. Na manhã de ontem, Sakineh pronunciou as mesmas palavras para Sajjad e Saide, durante visita dos filhos à prisão em Tabriz — a 538km de Teerã. “Ela repetiu o que já havia dito na entrevista à TV, confessando que era culpada pela morte do nosso pai, mas sua expressão facial e seus gestos queriam dizer o contrário”, admitiu Sajjad, 22 anos, em conversa com o Comitê Internacional contra a Pena de Morte e o Apedrejamento. Mãe e filhos se falaram durante 10 minutos, separados por uma parede de vidro.

A “dupla confissão” está longe de convencer ativistas de direitos humanos, que veem uma tentativa do regime do presidente Mahmud Ahmadinejad de apressar a execução da condenada, após comutar sua pena de apedrejamento para enforcamento. Em entrevista ao Correio, por telefone, a iraniana Mina Ahadi — fundadora e presidenta do mesmo comitê — denunciou uma artimanha do regime para tentar resistir ao clamor mundial. “Milhões de pessoas têm se oposto ao apedrejamento de Sakineh. Agora, o regime tenta colocá-la como assasina e executá-la”, comentou. “Sem execuções e sem apedrejamento, o governo não consegue sobreviver.” Mina acredita que Sakineh ainda pode ser salva. “Enquanto exercermos muita pressão sobre Teerã, eles não a matarão. As autoridades já desistiram do apedrejamento e, agora, precisamos intensificar a cobrança, a fim de libertá-la.”

Por e-mail, o também iraniano Mahmood Amiry-Moghaddam — porta-voz da organização não governamental Iran Human Rights — põe em xeque a própria credibilidade da TV estatal iraniana que exibiu a entrevista. “A despeito do que as imagens mostram e do que Sakineh diz, todos no Irã sabem que o programa 20:30 é mantido pelo Ministério da Inteligência e que quem aparece nele é forçado a fazê-lo”, afirmou. Mahmood não duvida que Sakineh se enquadre nesse caso e garante conhecer o motivo da “confissão”. “As autoridades estão muito nervosas por não terem conseguido deter Mostafaei e levaram-na à TV para depôr contra ele. O regime faz o que pode para danificar a credibilidade do advogado. Mas o fato é que ninguém crê no que o governo diz”, concluiu.

Atenção removida
O ativista e neurocientista de 39 anos também desqualificou a admissão de culpa de Sakineh perante os filhos. Segundo Mahmood, as autoridades não medem esforços para remover a atenção das violações dos direitos humanos. No entanto, ele vê um fator positivo. “É interessante que elas gastem muito tempo e energia nesse assunto, pois isso mostra que a pressão internacional funciona, especialmente quando o Brasil(1), tão amigo do Irã, está bastante envolvido”, declarou o porta-voz da Iran Human Rights. “O principal assunto não é o senhor Mostafaei, mas a natureza bárbara de um regime que apedreja pessoas até a morte.”

Mahmood tem a mesma opinião de Mina Ahadi. Ele acha que, enquanto a atenção mundial estiver sobre Sakineh, o regime iraniano terá que pagar um preço alto para executá-la. “O governo precisa espalhar o medo e usa as execuções, o apedrejamento e a amputação para isso. É uma questão de sobrevivência para os aiatolás.” O ativista lembrou que todos os dias iranianos são mortos pela Justiça. “Ontem (quarta-feira), três pessoas foram enforcadas, no oeste do país. No ano passado, mais de 400 acabaram executadas”, revelou.

1 - Embaixador desconhece pedido
O embaixador do Irã no Brasil, Mohsen Shaterzadeh, descartou ontem o envio de Sakineh ao Brasil. Ele negou que o Itamaraty tenha feito uma oferta formal ao governo do presidente Mahmud Ahmadinejad. O diplomata lembrou que o assunto envolve somente Teerã, pois a mulher condenada é iraniana. E denunciou uma manipulação da internet e da imprensa estrangeira para constranger as autoridades de seu país. “Nós não recebemos de forma oficial pedido ou oferta alguma (de asilo ou refúgio político) para esta senhora ser enviada ao Brasil. Não houve ofício por escrito, comunicado oral ou troca de notas, como é a orientação na diplomacia em casos assim”, garantiu. “Ocorreram crimes e serão julgados conforme o código do Irã, que segue preceitos morais e culturais do país.”

Depoimento
Desculpa para matar

Mahmood Amiry-Moghaddam
Confissões por meio da TV são comuns no Irã. Esse programa específico, chamado 20:30, está atualmente sob controle do Ministério da Inteligência iraniana. Normalmente é usado para que prisioneiros políticos confessem ter recebido dinheiro da CIA ou admitam participação na morte de gente inocente. O fato de a senhora Ashtiani ter confessado o adultério e o envolvimento com um assassinato poderia ser usado para justificar sua execução.

As autoridades iranianas estão sob intensa pressão e foram forçadas a remover a punição por apedrejamento, mas ainda insistem na execução. E uma execução não é inevitável enquando o mundo colocar foco sobre o caso. Mas ela estará em grande perigo, a partir do momento em que perder essa atenção. Eu creio que os esforços feitos pelo presidente brasileiro têm sido muito importantes para o caso Sakineh e espero que o Brasil, como país com fortes laços com Teerã, continue suas tentativas de promover os direitos humanos no Irã.

Mahmood Amiry-Moghaddam é porta-voz da ONG Iran Human Rights


Entrevista - Mohammad Mostafaei
“Ela foi forçada a falar aquilo”

“Em primeiro lugar, eu gostaria de ir ao Brasil. Eu gosto do Ronaldinho.” Assim o advogado iraniano Mohammad Mostafaei, 36 anos, começou a entrevista exclusiva ao Correio. O pouco domínio da escrita do inglês levou-o a receber as perguntas por meio do site de relacionamentos Facebook e traduzi-las para o farsi. Só então, por telefone, ele concedeu as respostas. A menção ao craque brasileiro foi uma forma de “quebrar o gelo”, antes de tocar no nome de Sakineh Mohammadi-Ashtiani — a mulher condenada por Teerã à morte por apedrejamento, sob a acusação de adultério. Mostafaei afirmou que sua cliente é inocente e considerou a confissão uma farsa. Também repudiou as críticas feitas por sua cliente, que o acusou de desgraçar a vida da família Ashtiani e de tê-la abandonado na prisão. “O governo forçou Sakineh Mohammadi a falar tudo aquilo diante das câmeras e a voltar-se contra mim. O regime pretende humilhar minha pessoa”, afirmou o advogado. A entrevista de pouco mais de meia hora foi encerrada com um anúncio: “Eu vou à Embaixada do Brasil amanhã e tentarei obter o visto. Viajarei a turismo, mas quero falar sobre Sakineh Mohammadi com autoridades de seu governo”. Desde o último sábado, Mostafaei vive em Oslo (Noruega), para onde fugiu depois que a polícia secreta israelense deteve sua mulher, seu sogro e seu genro.

Como o senhor vê a tentativa do Brasil de interceder em favor de Sakineh?
Estou feliz com o fato de o presidente Lula ter enviado uma mensagem sobre minha cliente para meu presidente (Mahmud Ahmadinejad) e para o governo iraniano. Foi uma boa ação. Eu acho que seu presidente quer pedir a todo o mundo que siga os direitos humanos. Ele quer enviar essa mensagem para todos os países. Nesse contexto, o caso de Sakineh é uma espécie de símbolo. É bom o interesse de seu presidente. Estou satisfeito. Obrigado, senhor Lula.

De que modo viu a confissão de sua cliente, em entrevista à rede de TV estatal iraniana?
Na noite de quarta-feira, o canal 2 de minha TV estatal transmitiu, por volta das 20h, a entrevista com Sakineh Mohammadi. A emissora é dirigida pelo Ministério da Segurança iraniana. Esse programa mostra pessoas famosas, a fim de transmitir aos outros cidadãos quais ações são boas para suas vidas. Por exemplo, tenta divulgar que o apedrejamento é bom para Sakineh Mohammadi. Eles querem justificar o ato irregular de minha cliente. Sakineh Mohammadi está presa e a Corte de meu governo a mantém sob custódia. Talvez eles ainda pretendam executá-la por apedrejamento. Ela está com medo disso. O governo forçou Sakineh Mohammadi a falar tudo aquilo diante das câmeras e a voltar-se contra mim. O regime pretende humilhar minha pessoa. Uma coisa importante é que Sakineh Mohammadi é inocente em relação ao apedrejamento. Ela não confessou o crime de adultério. Na entrevista, ela falou mais sobre mim. É o que o governo pretende. O governo não pode me prender. Fui forçado a sair do Irã e a falar coisas ruins sobre meu governo.

Mas ela teria repetido tudo o que disse, hoje (ontem), dessa vez diante dos filhos…
É uma forma que as autoridades iranianas encontraram para se justificarem.

Sakineh criticou sua interferência no caso e acusou-o de “desgraçá-la”. Também disse que vocês nunca se viram…
Tudo o que ela disse sobre mim não é verdade. Eu a vi no mês passado. Conversamos sobre as leis. Eu conheço o caso dela e sei que é inocente. Ela foi pressionada a mentir.

O senhor acredita que a execução dela é iminente? Existe algo que o mundo possa fazer para salvá-la?
Em seu caso, ela seria enforcada. Mas o governo não pode machucá-la. Acho que outros países e governos podem salvar minha cliente. Mas… eu não tenho certeza. Não sei do futuro, de como meu governo agirá, principalmente em relação a Ashtiani. Talvez o governo a execute, talvez a salve. Não é algo fácil de prever. Nos últimos anos, o governo executou vários prisioneiros, de maneira secreta.

O fato de o senhor ter fugido não prejudicou ainda mais Sakineh?
Sim, não foi algo bom para Sakineh. Mas tive de fazer isso por minha mulher e por minha filha. Eu deveria ajudar minha cliente no Irã. No entanto, fui forçado a vir. O governo sequestrou minha mulher e prendeu meu sogro e meu cunhado. E afirmou que eu deveria ir à prisão para que eles fossem libertados. Eu não pude aceitar esse pedido. A polícia secreta iraniana espancou a mim e à minha família, invadiu minha casa, fechou meu escritório e me forçou a sair do Irã. Eu tenho certeza de que eles vão libertar meu sogro e meu cunhado, como fizeram com minha mulher. (RC)
http://www.formadoresdeopiniao.com.br

Rodrigo Craveiro

Para outras informações você poderá acessar também http://www.estadao.com.br/especiais/caso-sakineh-ashtiani,114740.htm

Em defesa da vida de Sakineh Mohammadi

Após as manifestações de repúdio de vários países e diversas organizações de direitos humanos o governo iraniano suspendeu temporariamente a sentença de Sakineh Mohammadi.
Após ficar viúva, a acusação é que ela manteve relações sexuais, o que para as leis islâmicas é considerado crime de adultério. Apedrejamento ou lapidação é a sentença para adultério da mulher. O processo consiste em enterrar a pessoa deixando apenas a cabeça exposta para uma multidão apedrejar até a morte. Faz lembrar o tempo em que Cristo defendendo Madalena disse a multidão que atirasse a primeira pedra aquele que nunca pecou.
Além dessa bárbara punição atribuida como massacre a sexualidade feminina, membros do tribunal tem direito a julgamento subjetivo endossado pela religião.
E agora assistimos o desenrolar do caso e suas manipulações após as interferências políticas internacionais.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

terça-feira, 10 de agosto de 2010

A Inquisição na atualidade / A destruição da mulher e do feminino que nela reside

terça-feira, 10 de agosto de 2010
Cultura, Tradição não justifica ASSASSINATO
É legítimo se intrometer na cultura de determinado país ou região?
Do ponto de vista antropológico, cada povo tem suas tradições e crenças e qualquer interferência forçada vinda do exterior seria autoritarismo.
Respeito e concordo com tal colocação. Porém, tal postura não pode se adequar a qualquer situação: preservar a tradição oral , os costumes dos índios da Amazônia é uma coisa, aceitar que se corte a genitália de meninas na puberdade para que não sintam prazer na idade adulta é diferente.

O caso da iraniana SAKINEH ASHITIANI, condenada à morte por um suposto adultério, exige uma postura clara.

Mesmo considerando a complexidade das relações internacionais, não podemos ignorar que se trata de um ASSASSINATO CRUEL, POR APEDREJAMENTO, isto não é somente respeito à tradição.
Repete-se hoje o que se fazia na idade média: queimar mulheres na fogueira sob a acusação de serem BRUXAS.
Estão matando uma mulher por ter supostamente traído o marido.No sec. XXI não podemos aceitar tal barbárie.
Não é uma questão de desrespeitar a soberania do Irã, mas é sim, não compactuar com um ato de extremismo.

Não quero deixar de sentir, para somente pensar: Mahmoud Ahmadinejad, poderia ter aceitado o oferecimento do governo brasileiro de asilo a Sakineh , preferiu mantê-la na prisão esperando o apedrejamento, que deverá ocorrer amanhã.

Me sinto abatida pela impotência, não aceito também a inércia dos movimentos de mulheres. A passividade do mundo.

Com o extremismo do governante iraniano, está reforçada a posição bélica dos Estados Unidos e da União Européia.
Amanhã vestirei preto, amanhã estarei em oração por Sakined.
Nunca serei politicamente correta, se para isso tiver que parar o meu coração e não sentir a importância da vida, para além das convicções.

Vera Britto
http://verabritto.blogspot.com